Edição 130 - Dezembro/2018

Os encantos do chá e a magia da gratidão

Data: 03/12/2018
Por: Ana Carolina Basile
Editoria: Edição 130 - Dezembro/2018

Uma música tranquila e a essência de chá que se espalha pela sala de aula. À mesa, utensílios utilizados no tradicional chá da tarde da Inglaterra. Algumas xícaras sobre pires e um algodão, entre eles - detalhe cuidadosamente percebido para evitar qualquer ruído quando a xícara voltar a entrar em contato com o pires.

Os mimos - uma fruta, um doce e uma flor comestível- são para que os alunos convidados percebam a diferença entre tomar o chá com e sem acompanhamento. O pacotinho do sachê é colocado dentro de outro pacotinho, em que um dos lados tem uma florzinha colada e o outro, uma etiqueta com os ingredientes.

No centro da mesa, em uma posição acima dos outros utensílios, o principal: o bule onde será preparada a bebida, a fim de que seja servida aos presentes na mesma intensidade e temperatura. Ele pode ser usado para colocar a água, nos casos em que o chá é feito de forma individual, diretamente nas xícaras.

Quem organiza a cerimônia do chá é a Tea Master, Lilia Dinelli. Em julho de 2013, ela teve um insight e começou a pesquisar escolas especializadas na cultura do chá. A princípio, encontrou uma na França, contudo, à época, não tinha condições financeiras de viajar para lá. Continuando a pesquisa, descobriu a Escuela Argentina de Té, em Rosário, na Argentina. Em agosto, já havia se inscrito e iniciou o curso.

O primeiro foi de sommelier de chá. No mês seguinte, matriculou-se em outro, de Especialista em Protocolo e Cerimonial de Chá, acabando por frequentá-los de maneira concomitante. Cada um teve a duração de oito meses. Ao término, inscreveu-se no curso de Tea Business Manager, no qual se estuda a parte comercial do chá (importação e exportação), segundo as leis da Argentina. Os dois últimos cursos foram a base para que ela pudesse ingressar no último e de mais alto nível do instituto: o de Tea Master.

Ao cursá-lo, Lilia deparou-se com a história da bebida, desde sua origem, no Oriente, em especial, na China. Uma vez por mês, ia à Argentina para estudar. Os primeiros três cursos foram dados na capital, Buenos Aires, em um hotel. O último, de Tea Master, foi lecionado em Rosário, na sede da escola.

Atualmente, Lilia ministra o curso Introdução ao Universo do Chá, na Faculdade Messiânica, em São Paulo. Como parte do plano programático, aborda as questões históricas do chá, o olhar filosófico por de trás e a relação dos países do Oriente com a bebida.

Como proposta, tenta levar os quatro pilares da cerimônia de chá japonesa: harmonia, respeito, pureza e tranquilidade, para o curso. Isso porque, uma vez que a conversa se tornou um hábito na mesa ocidental, na oriental, preza-se pelo silêncio.

Além disso, dentro da experiência junto às pessoas que fazem o curso, ela busca resgatar a percepção quanto aos cinco sentidos do ser humano - visão, audição, tato, olfato e paladar - que, em sua opinião, está adormecida devido à correria do dia a dia. "Não pensamos mais na existência deles devido à modernidade, mas são fundamentais para a nossa vida", observa.

Para que os alunos entendam a importância de não permitir que a agitação diária os impeça de notar a presença dos cinco sentidos, Lilia trabalha o sentimento de gratidão.

Durante uma pausa, ela leva os alunos a perceber os sentidos, um por um. Ela promove o exercício fazendo-os reparar na atuação de cada sentido, diante da mesa do chá. Seu objetivo é estimulá-los a refletir sobre o momento presente e a agradecer aos cinco sentidos, que lhes possibilitam apreciar cada detalhe da cerimônia. "Assim como tratamos a visão diante de uma mesa, usamos a audição por meio da água caindo na xícara", exemplifica. O aroma do chá, a temperatura ao segurar a xícara e o sabor da bebida são percebidos graças aos demais sentidos, olfato, tato e paladar, respectivamente.

Esse momento ocorre devido à ideia de pragmatismo que Lilia passou a trabalhar em suas aulas, a partir do estudo dos Ensinamentos de Meishu-Sama. Para ela, vivê-lo é aplicar o que ele ensinou, no cotidiano.

Ela acredita que a palavra rotina, hoje, ficou pejorativa e isso não pode ocorrer, uma vez que a rotina é a própria vida, o cotidiano das pessoas. "Se saímos de manhã e trabalhamos o dia inteiro, o tempo está passando neste momento, e isso é a vida que passa. Então, eu busco, no meu cotidiano, vivenciar o sentimento de gratidão."

Seja acompanhada ou sozinha, a Tea Master procura oferecer o seu melhor, observando o momento de reflexão que a degustação do chá proporciona. "Para mim, o chá tem uma espécie de magia", finaliza.